Crédito: Arquivo pessoal
Sossego, segurança e saúde. São esses três “s” que, segundo o advogado especialista em Direito Imobiliário, Michel Rosenthal Wagner, norteiam os direitos e deveres de donos de animais de estimação e a administração do condomínio. Mas quando o assunto é legislação, amantes de pets e vizinhos injuriados, o buraco, definitivamente, é mais embaixo.
Belinha é uma Poodle micro de 6 anos, o xodó de dona Nancy Pilares. A cachorrinha é levada para todos os lugares dentro de uma sacola especial, e segundo a dona, nunca é posta no chão, já que a pequena precisa estar sempre limpa para subir na cama. Nancy nunca teve problemas com Belinha em seu apartamento, localizado no bairro de Pinheiros, na capital paulista, mas há dois anos, a proprietária começou a ter adversidades com o outro condomínio onde possui apartamento, em São Vicente, litoral norte de São Paulo. “É um espaço que uso para férias, mas depois que comecei a ter problemas para entrar no prédio por causa da Belinha, até deixei de ir com tanta frequência”.
Nancy relatou que Elza Perez Santos, síndica do prédio, tem dificultado a sua entrada com o animal, alegando que a cadela sujou as dependências do condomínio e que também late demais. “Na verdade, segundo as leis internas do edifício, ter animal de estimação é proibido, e eu entrei na Justiça para suspender essa cláusula”, explica Nancy.
Denise Grecco Valente, advogada civil e especialista em casos como o de Nancy, alerta sobre os abusos que muitos condomínios cometem ao vetar animais em suas dependências. “Apesar da Constituição Brasileira não proibir nenhum condomínio de proibir animais, existe o direito a propriedade que é garantido a todos. O que se pode fazer é limitar o trânsito de pets, pedir o uso da coleira, focinheira, etc, mas jamais proibir que o morador tenha animais em sua residência.”
Rosenthal faz coro à colega de profissão e ressalta que apesar de ser frequente desentendimentos entre condomínio e condômino, o bom senso é a palavra-chave. Para ele, os problemas que chegam ao tribunal são resolvidos caso a caso, de maneira que o juiz seja convencido pela parte que mais tiver razão. “Um dos casos que defendi, o condomínio pedia a retirada de um Poodle do apartamento, mas a mãe, que representava a filha, dona do cão, provou os benefícios para uma criança de manter um animalzinho dentro de casa, além de mostrar que ele não fazia barulho e nem ameaçava o sossego de ninguém. Nesse caso, o juiz deu ganho de causa para a mãe sem maiores problemas.”
Mas o advogado destaca que nem sempre o caso é resolvido tão amigavelmente, muito menos, com rapidez. “Os processos judiciais tendem a ser longos, entre 8 meses a 10 anos. Obviamente, qualquer acordo entre as duas partes faz com que o caso se encerre antes, mas nem sempre isso acontece”.
Quando a culpa é do dono
Apesar de serem comuns as disputas entre vizinhos ou mesmo com o condomínio, nem sempre o dono do cãozinho tem razão. Não são raros os casos que por causa dos donos, os animais extrapolam no barulho ou mesmo no quesito salubridade, e são obrigados a deixar o condomínio. “Participei de um caso onde o morador não saía para passear com o cão e o cheiro de fezes empesteava todas as outras coberturas do edifício. Foi decidido que o animal fosse levado para passear todos os dias, como não foi acatado o pedido, o cão precisou ser retirado”, conta Michel Rosenthal.
Segundo o especialista, outra reclamação recorrente é quanto ao barulho, arranhões no assoalho e latidos. “Muitas vezes o dono deixa o animal o dia inteiro em casa, que por sua vez, late muito. Nesses casos é notável o incômodo e o juiz provavelmente dará ganho de causa ao condomínio”. O advogado ressalta, no entanto, que a tolerância continua sendo a chave, já que fora do horário de silêncio, por lei, ninguém é obrigado a ficar quieto. “Em prédios é possível ouvir diversos tipos de barulhos, desde discussões de casais, a som de furadeira e instrumentos musicais. Latidos não ficariam de fora. Até isso podemos argumentar na Justiça, explica Denise.
Rosenthal finaliza explicando que grande parte dos problemas judiciais ainda são causados pela falta de tolerância e afetividade entre vizinhos, e que o segredo para que as pessoas passem a conviver em harmonia está justamente nesses fatores. “Vida em condomínio implica convivência, e para que ela seja bem sucedida, ela precisa ser de qualidade. O limite de tolerância é maior quando há afeto nas relações. Então, o que eu sempre indico para os vizinhos é que interajam e promovam relações e vínculos afetivos.”
Como proceder
Disputas entre vizinhos são mais frequentes do que se imagina. Pensando nisso, o advogado Michel Rosenthal orienta, a seguir, as pessoas que passam por problemas com a proibição de pets no condomínio a lidar com o caso:
- 1. Caso o morador receba uma notificação formal do condomínio, ele deve primeiramente solicitar uma assembleia geral para tentar resolver o caso amigavelmente.
- 2. Se não for possível resolver com a primeira manobra, o morador deve entrar com um pedido de anulação da cláusula do regimento interno que proíbe animais em condomínios.
- 3. Enquanto estiver acontecendo o processo o dono deve pedir uma liminar na Justiça que autorize a permanência do animal no prédio até que o caso se encerre.
- 4. Caso essa liminar seja recusada, o cão deve ser retirado imediatamente. Ao final do processo, se ficar comprovado que o animal deve voltar ao prédio, o condomínio pagará uma indenização ao morador por ter sido obrigado a retirar o cão. Caso ficar comprovado que o cão realmente não deve permanecer no prédio, quem paga a indenização é o morador.
- 5. O advogado ressalta que as multas são estipuladas pelo juiz e podem variar de caso a caso. Em média o valor alcançado não pode ser superior a 10 vezes o valor pago pelas taxas condominais. Ex. Se o morador paga 500 reais por mês de condomínio, sua multa poderá ser de até 10 x 500, no caso, 5 mil reais.
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